D.Pedro II recebendo a comunicação oficial da Proclamação da República
Ação Monárquica

O 15 de novembro, como eu vi!

Acordei hoje, lá pelas 4 da manhã, para tomar os remédios de praxe, e como perdi o sono fui para o computador fazer algumas pesquisas para este artigo. O site da Hemeroteca Nacional é um dos que mais gosto de visitar, pois permite uma pesquisa detalhada em jornais antigos.

Fui então para o ano de 1889, mais precisamente, para o final do fatídico ano. Caminhava eu, então, pelas ruas do velho Rio de Janeiro (naquela época era possível caminhar de madrugada, tranquilamente, pelo centro da cidade maravilhosa, sem perigo). A madrugada quente prenunciava um dia mais quente ainda e os jornais já estavam sendo distribuídos pelos diversos vendedores que os anunciavam aos gritos. Me dirigia para a Praça da Aclamação quando encontro um menino anunciando a nova edição do jornal católico, O Apóstolo.

Pedi um exemplar e comecei a ler, sentado num banco ao lado do lampião a gás ainda aceso, que iluminava o local.

Dali eu poderia ver a cidade amanhecendo e começando a sua vida diurna. A praça mudaria de nome, após os acontecimentos que estavam prestes a se realizar.

A capital do Império acorda e começa a se movimentar. Aos poucos as lojas vão se abrindo, as repartições públicas também, entretanto algo no ar, diz que nada vai bem. Entretanto, tudo corria normalmente.

Resolvi ir até a redação do jornal que tinha em mãos, não longe dali. As conversas na redação giravam em torno da provável queda do gabinete de ministros. O jornal, entretanto, nada dizia, mas na redação já preparavam a nova edição. Enquanto o redator chefe ditava, um subalterno anotava e já passava para o seu assistente montar as placas onde os caracteres invertidos imprimiriam o artigo da próxima edição.

O redator, se referindo aos acontecimentos, assim ditava seu artigo:

Despertou esta capital no meio de acontecimentos tão graves e tão imprevistos que as primeiras horas do dia foram de geral surpresa.

Rompeu com o dia um movimento militar que, iniciado por alguns corpos do exército, generalizou-se rapidamente pela pronta adesão de toda a tropa de mar e terra existente nesta cidade.

A consequência imediata destes fatos foi a retirada do ministério de 7 de Junho, presidido pelo Sr. visconde de Ouro Preto, que teve de ceder à intimação feita pelo Sr. marechal Deodoro da Fonseca, que assumira a direção do movimento militar.

Enquanto o Redator elaborava seu artigo, minha atenção foi desviada para uma relação dos fatos ocorridos e anotados em detalhes nos permitia ver tudo o que acontecera. Vamos então acompanhar:

Às 5 horas da manhã estavam no arsenal de marinha os Srs. visconde de Ouro Preto, presidente do conselho, conselheiros Cândido de Oliveira e barão de Ladário, ministros da justiça e da marinha, que para ali haviam ido, avisados de que se preparava algum movimento.

Às 5:15 desembarcou o batalhão naval, com 160 praças, a banda de tambores e cornetas.

Às 5:45 começaram a desembarcar forças do corpo de imperiais marinheiros que, às 6 horas, em número de 196 praças, saíram com uma metralhadora, sob o comando do 1º tenente Manoel Dias Cardoso.

Às 6:30 chegou ao arsenal o Sr. conselheiro Diana, Ministro dos negócios estrangeiros. Pouco depois saíram os ministros para o quartel-general do exército, no campo da Aclamação.

Ali, já estava, na respectiva secretaria, o Sr. visconde de Maracaju, Ministro da guerra, com os Srs. ajudante-general, generais Barreto, barão do Rio Apa, Amaral, seus estados-maiores e alguns oficiais de diferentes armas.

Às 7 horas chegou ao quartel o corpo militar de polícia da corte, comandado pelo coronel Antonio Germano de Andrade Pinto, e comporto de 450 praças de infantaria e 85 de cavalaria.

Pouco depois apresentou-se o corpo de bombeiros.

O Sr. barão do Ladário saiu então do quartel-general e dirigiu-se para o arsenal de marinha, a fim de dar algumas providencias.

Ao mesmo tempo, quase, chegavam os Srs. barão do Loreto e conselheiro Lourenço de Albuquerque.

Eram 8 horas quando apareceu no campo, e postou-se em frente do portão principal dos quarteis, o capitão do 1º regimento de cavalaria Godolfim, com uma escolta de oito soldados do mesmo regimento, armados de carabinas.

Alguns minutos depois apresentou-se o Sr. marechal Deodoro, com seu estado-maior, e à frente do 1º regimento de cavalaria, comandado pelo tenente-coronel Telles, do 9º regimento, pelo major Solon, do 2º de artilharia, pelo major Lobo Botelho, e dos alunos da escola superior de guerra, formando todos em linha de combate.

O Barão do Ladário que voltava ao quartel foi intimado pelo oficial comandante da escolta do Marechal Deodoro a entregar-se. Ele recusou-se e tentou se defender, mas o revolver negou fogo. O barão foi atingido por 4 tiros e levado para sua residência.

Uma das reivindicações dos militares revoltosos era o fim do gabinete de ministros os quais resolveram, após conferenciar com os generais presentes na secretaria, pedir a exoneração. Para tanto, enviaram o seguinte telegrama a Petrópolis, onde se encontrava o Imperador.

Senhor. – O ministério, sitiado no quartel general da guerra, à exceção do Sr. ministro da marinha, que consta estar ferido em uma casa próxima, e diante das declarações dos Srs. generais visconde de Maracaju, Floriano Peixoto e barão do Rio Apa, de que não inspira confiança a força que vem, não há possibilidade de resistir com eficácia à intimação de exoneração feita pelo marechal Deodoro, apesar das ordens que para a resistência se deram, vem depor nas mãos de Vossa Majestade o seu pedido de exoneração.

Dom Pedro II, ao receber o telegrama deu ordens para organizar sua volta à capital do Império. Enquanto isso, o marechal Deodoro, informado da decisão dos Ministros, entrou na sala onde eles se encontravam e deu o golpe, não apenas contra o gabinete, mas também contra o Império do Brasil.

Após uma longa exposição, na qual expunha as queixas do exército contra o ministério, o marechal Deodoro deu ordem de prisão aos ministros, “declarando que seriam recolhidos ao Estado Maior e aí tratado com a maior consideração até partirem para fora do país”.

Mas, como estamos no Brasil… o Ajudante General do Exército, apelou para a amizade e camaradagem do marechal e obteve que Deodoro da Fonseca desistisse da prisão e expatriação do Visconde de Ouro Preto e de Cândido de Oliveira.

José do Patrocínio, vereador à época, aderiu ao movimento republicano e em discurso entusiasmado a defendeu na Câmara que se encontrava lotada pelo povo.

O Imperador, parece não ter percebido o quê desejavam os militares, pois tentou em “demorada conferência” demover o visconde de Ouro Preto do pedido de exoneração.

Enquanto Dom Pedro II aceitava constrangido o pedido do visconde, Deodoro que recebera o discurso de José do Patrocínio, como justificativa para seu gesto, fez a seguinte proclamação:

“Cidadãos. – O povo, o exército e a armada nacional, em perfeita comunhão de sentimentos com os nossos concidadãos residentes nas províncias, acabam de decretar a deposição da dinastia imperial e consequentemente a extinção do sistema monárquico representativo.

Como resultado imediato desta revolução nacional, de caráter essencialmente patriótico, acaba de ser instituído um governo provisório, cuja principal missão é garantir com a ordem pública a liberdade e os direitos dos cidadãos.

Para comporem esse governo, enquanto a nação soberana, pelos seus órgãos competentes, não proceder á escolha do governo definitivo, foram nomeados pelo chefe do poder executivo da nação os cidadãos abaixo assinados.

Concidadãos. – O governo provisório, simples agente temporário da soberania nacional, é o governo da paz, da liberdade, da fraternidade e da ordem.

No uso das atribuições e faculdades extraordinárias de que se acha investido para a defesa da integridade da pátria e da ordem publica, o governo provisório, por todos os meios ao seu alcance, promete e garante a todos os habitantes do Brasil, nacionais e estrangeiros, a segurança da vida e da propriedade, o respeito aos direitos individuais e políticos, salvas, quanto a estes, as limitações exigidas pelo bem da pátria e pela legitima defesa do governo proclamado pelo povo, pelo exército e pela armada nacional.

Concidadãos.- As funções da justiça ordinária, bem como as funções da administração civil e militar, continuarão a ser exercidas pelos órgãos até aqui existentes, com relação aos atos na plenitude de seus efeitos> com relação às pessoas, respeitadas as vantagens e os direitos adquiridos por cada funcionário.

Fica, porém, abolida, desde já a vitaliciedade do senado e bem assim abolido o conselho de Estado. Fica dissolvida a câmara dos deputados.

Concidadãos. – O governo provisório reconhece e acata todos os compromissos nacionais contraídos durante o regime anterior, os tratados subsistentes com as potencias estrangeiras, a dívida pública externa e interna, os contratos vigente e mais obrigações legalmente estatuídas.

Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, chefe do governo provisório.

Aristides da Silveira Lobo, ministro do interior

Rui Barbosa, ministro da fazenda e interinamente da justiça.

Tenente-coronel Benjamim Constant Botelho de Magalhães, ministro da guerra.

Chefe de Esquadra Eduardo Wandenkolke, ministro da marinha

Quintino Bocaiuva, ministro das relações exteriores e interinamente da agricultura, comércio e obras públicas.

Eis o teor da proclamação da república brasileira, exatamente como foi publicada pelos jornais tão logo foi emitida.

O calvário da Família Imperial e do Brasil não terminou com o exílio, pelo contrário, foi o começo de toda a decadência moral, política e econômica da Nação.

Publicação no Jornal O Apóstolo de 17 de novembro de 1889 do texto da Proclamação da República enviado ao Imperador Dom Pedro II pelo Marechal Deodoro da Fonseca.
Publicação no Jornal O Apóstolo de 17 de novembro de 1889 do texto da Proclamação da República enviado ao Imperador Dom Pedro II pelo Marechal Deodoro da Fonseca.

 

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