Proatividade e diversidade intelectual Dia do Estudante comemora a assinatura do decreto que criou os primeiros cursos de direito, por D. Pedro I, em 1827 Agência Fapesp O Dia do Estudante, comemorado em 11 de agosto, remete à data em que o imperador D. Pedro 1º assinou, em 1827, o decreto que criava os dois primeiros cursos de Direito do Brasil: em São Paulo e em Olinda (PE). Segundo João Grandino Rodas, diretor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) – também conhecida como Faculdade de Direito do Largo de São Francisco – o impacto cultural e social da criação da instituição paulista há 182 anos inaugurou uma tradição de diversidade intelectual e de oposição às arbitrariedades que justifica a transformação do marco do nascimento dos cursos jurídicos em uma data que homenageia os estudantes de todas as áreas. “Com o tempo, a significação do dia 11 de agosto ampliou-se. A data marca não unicamente o início dos cursos jurídicos no Brasil mas, praticamente, o começo do ensino superior no país, sendo, portanto data comemorativa de todos os estudantes”, disse à Agência FAPESP. Exatamente cem anos depois do decreto de 11 de agosto, em 1927, a data foi escolhida para a comemoração do Dia do Estudante. Em 11 de agosto de 1937, foi fundada a União Nacional dos Estudantes (UNE). De acordo com Rodas, a Faculdade de Direito – que foi a primeira instituição a integrar a USP no momento de sua criação, em 1934 – teve, desde o século 19, uma influência marcante na formação de lideranças brasileiras, gerando alguns dos principais advogados, políticos, poetas, jornalistas e escritores na história do país. “Um aspecto que sempre foi próprio dos estudantes do Largo de São Francisco é a proatividade em relação às grandes questões nacionais, como a abolição da escravatura e a redemocratização”, disse Rodas, que é docente da Faculdade de Direito da USP desde 1971. De acordo com o presidente da FAPESP, Celso Lafer, também professor titular da Faculdade de Direito da USP, o dia 11 de agosto é o início simbólico dos cursos superiores no Brasil e, na cidade de São Paulo, o marco inaugural da presença dos estudantes como um grupo específico. “Isso foi adquirindo um significado que vai além da Faculdade de Direito e terminou por marcar tanto o ensino superior como as atividades culturais de modo geral. O impacto cultural da aglutinação estudantil em São Paulo foi muito amplo”, disse. A experiência do convívio acadêmico proporcionada pela faculdade, segundo Lafer, levou à criação de uma rede de amizades que reunia, pela primeira vez, a inteligência de diversas regiões do país. “Esses estudantes foram integrar a classe política, a burocracia do Império, a direção de jornais e os principais círculos literários do país. Todo o romantismo – Castro Alves e Fagundes Varela, por exemplo – beneficiou-se dessa rede”, destacou. Segundo Rodas, na época colonial da história brasileira não havia instituições de ensino superior. Os estudantes que queriam e podiam estudar dirigiam-se a Portugal. Somente com a vinda de Dom João 6º e da Família Real ao Brasil, em 1808, surgiram as primeiras faculdades. “A primeira foi a Escola de Medicina da Bahia, em Salvador, então capital do Brasil-reino. Com o intuito de preparar os dirigentes do recém-fundado império, Dom Pedro 1º instituiu, com o decreto de 11 de agosto de 1827, duas escolas de Direito, uma em Olinda e outra em São Paulo, sendo que esta foi a primeira a entrar em funcionamento, utilizando-se do espaço e da biblioteca do Convento do Largo de São Francisco, que havia sido fundado em 1645”, contou. Apesar do provincianismo de São Paulo em 1827, a decisão de instalar a nova faculdade na cidade pode ter sido tomada em razão da localização geográfica, capaz de atender à região Sul e Minas Gerais, além do fácil acesso ao porto de Santos. “Há quem diga que a localização de um faculdade na insignificante vila de São Paulo – que era então uma mera passagem de tropeiros – deveu-se à influência da Marquesa de Santos, à época já casada com Tobias de Aguiar e moradora vizinha do páteo do Colégio”, disse. A chegada da Academia e dos estudantes, segundo Rodas, trouxe vida à cidade, que só na década de 1870 seria beneficiada pelas rendas da cafeicultura. “Pode-se imaginar o que significou a chegada de estudantes no pequeno vilarejo. Os jovens eram cortejados, pois representavam a redenção econômica e social do lugar. Daí a naturalidade do ”pindura”, o costume dos estudantes do Largo São Francisco de comemorar o dia 11 de agosto fazendo refeições em restaurantes e saindo sem pagar.” Como os estudantes eram poucos em número, era encarado com naturalidade que, na data de aniversário da faculdade, os estabelecimentos brindassem com gratuidades os fregueses de todo o ano. “Obviamente que hoje, sendo milhares os estudantes, há necessidade de se repaginar certos aspectos folclóricos mais facilmente aceitáveis no passado, como o ”pindura” e a ”peruada” – em que os estudantes ”se apropriavam” de um peru de um vizinho da faculdade, preparavam-no e em seguida convidavam o dono da ave para almoçar, sem saber que estaria degustando seu próprio peru”, disse Rodas. Segundo ele, no entanto, as lembranças dessas “estudantadas” ainda permeiam o imaginário dos atuais alunos de Direito e de outras carreiras. “Tanto é assim que os ”pinduras” continuam sendo realizados, ainda que na maior parte das vezes em combinação com os proprietários dos restaurantes. Entretanto, ainda acontece de, ao se negar a pagar a conta, os comensais acabarem na delegacia de polícia, para a lavratura de boletim de ocorrência”, disse. Velha e nova Academia Aluno da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco na segunda metade da década de 1960, Rodas afirma que mesmo durante o período da ditadura militar as tradições estudantis se mantiveram. “Posso testemunhar que nos anos difíceis de então, em que mesmos os estudantes se dividiam em campos opostos, o dia 11 de agosto não deixou de ser festejado e a peruada – atualmente um cortejo que passeia pelas ruas do centro da cidade – não deixou de ser realizada. Tratava-se de um momento de congraçamento que punha de lado as divergências”, disse. Hoje, de acordo com Rodas, a Faculdade de Direito da USP está passando por uma atualização no que se refere a seu projeto pedagógico, à ampliação e modernização de suas instalações físicas, ao aumento do número de professores, à introdução dos meios eletrônicos modernos, à interdisciplinaridade – possibilitando que os alunos cursem disciplinas em outras faculdades da USP e no exterior – e à digitalização da primeira biblioteca pública de São Paulo, inaugurada em 1645 com o Convento de São Francisco. “A ”Velha e sempre nova Academia” é a casa de todos os que cultuam o Direito no Brasil e não apenas dos que estudaram lá. Daí a sua responsabilidade de, não se esquecendo de seu passado glorioso, ir-se modernizando e contribuindo para a melhora do ensino jurídico no Brasil”, disse. |
Um grupo de amigos reunidos para divulgar, difundir, apoiar, os esforços de todos os brasileiros para restaurar a forma monárquica de governo.